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{Cotovia} e Companhia

Olá Pessoas! Bem-vindas ao blogue da Cotovia onde (m)ando {cotovia}ando! Sigam a cor deste vôo: "Nascemos poetas, só é preciso lembrá-lo. Saber é quase tudo. Sentir é o Mundo." @mafalda.carmona

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{Cotovia} e Companhia

24
Mar23

O Professor... e as Greves


Cotovia@mafalda.carmona

...ou o sarcófago...

ou a asfixia do sistema de educação, ou a turma dos 14...ou abram alas se faz favor...

  • O professor C. era o professor coordenador do módulo de disciplinas técnicas e práticas de eletrotecnia. Foi meu professor, e de mais 13 alunos, durante 3 anos. As aulas decorriam em salas numa ala do edifício situada no piso térreo, com umas janelas estreitas de vidro reforçado em arame, com vista para o estacionamento, onde nunca entrava o sol, por estarem viradas a norte. Por isso, cheirava a mofo, e as placas de madeira que serviam para montar os circuitos de eletricidade, eram desagradáveis ao toque e deixavam um cheiro a madeira prensada desagradável, como o cheiro do cartão molhado.

As aulas de Matemática, Português, Físico-química, Filosofia, Inglês e Educação física, eram distribuídas pelas outras alas do edifício, em salas com janelas, bem iluminadas e algumas delas até no segundo piso, ou mesmo, como as de filosofia, na sala "anfiteatro", com boa vista. Por isso muitos dos 14, quando juntos aos restantes da turma geral, passavam mais tempo a olhar pela janela do que para o quadro bem iluminado, a receber luz pelo lado certo, sendo possível ver tudo o que lá se escrevia.

E eu fazia parte do leque que, nas aulas gerais, escolhera um lugar à janela, bem lá atrás, onde passava a maior parte do tempo a olhar para as nuvens, as pessoas e a praça, mesmo se agora já se via para o quadro.

Nos anos anteriores a esta experiência do "sarcófago elétrico", como interiormente passei a chamar ao conjunto de salas dos 14, escolhia uma carteira na fila da frente, de modo a ver bem o que se passava no quadrado preto, pois sou míope, e tinham deixado de nos sentar por ordem alfabética a partir do 7° ano, o que era muito bom para mim, porque não tinha de andar a fazer pedidos para me sentar na fila da frente, ou antes o meu encarregado de educação, pois para muitas pessoas a pitosguice alia-se à confusão auditiva, e nunca se chega a ver verdadeiramente bem, pois, a cada mês, a graduação aumenta um aro de fundo de garrafa nas lentes dos óculos, e não há orçamento familiar que aguente tanta mudança de lentes, destas, chamadas, miopias progressivas ou grandes míopes, o meu caso.

Por causa destas (des)ordens alfabéticas as amigas e amigos de escola têm todos os nomes ou começados por M, ou antes, o Luís tinha sido meu colega de carteira durante anos, ou a Mané (Maria Manuela), Maria João, o Mário, o Miguel, o Nuno, a Paulinha, o Paulo ( o "meu" Paulo), o Pedro, a Rita ( a "minha" Rita), o Rui, o Vítor, o Sérgio e por último, o Telmo, que ironia do destino, maldade, foi o primeiro de nós a partir em 2017, vítima de acidente na A1.

Ainda hoje, felizmente, muitos destes, se mantém como amigos, e com um deles até casei há mais de 33 anos, e é o pai das minhas filhas e avô dos meus netos, o que não deixa de ser interessante, pensar se me chamasse Ana, qual seria o efeito que isso teria tido.

Mas voltemos às aulas no sarcófago, onde os 14, mais o professor, 15, cumpriam o seu horário nas salas de aula com más condições, onde a má iluminação, era além de insuficiente, incorreta, pois o quadro estava posicionado a receber a luz vinda da direita, não víamos nada do que lá se escrevia, sendo a má ventilação responsável pelo acumulo de bolores e fungos.

Talvez por isso, o Professor C. andava sempre a fungar e a tossir, pelo que trazia consigo um lenço, de pano, como se usava na altura, com a inicial do primeiro nome do professor, outra que não a C, mas nesse tempo o respeito era muito bonito e mantinham-se as distâncias, pelo que não sabíamos qual o primeiro nome desta inicial, que tal como a identidade do seu portador, estava guardado no bolso do casaco, onde se assoava (no lenço, claro), que depois de aberto e usado, era dobrado meticulosamente para voltar para o bolso, até próxima utilização. Tudo muito ecológico.

Mas se pensam que o busílis era, apenas, a falta de condições da sala, esclareço que não era.

O busílis era que o professor tinha um ditado de sua estima, que repetia todos os anos, logo na primeira avaliação, quando ia entregando os testes, por ordem crescente de classificação, até chegar ao último, que neste caso era o primeiro, tomando à letra o estrito cumprimento deste ditado popular dos "últimos são os primeiros" para quando o aluno que melhor nota obtivera, e aguardava o teste, que o professor C. retinha, entre o polegar e o anelar, enquanto segurava um cigarro entre o indicador e o dedo médio, fazendo demorar e render o peixe. 

Se acham que a descrição é demorada, estou a ser bem sucedida ao transmitir o sofrimento impaciente que se apoderava de todos os 14, sem exceção.

Assim o décimo quarto recebia, finalmente, o seu teste e ao mesmo tempo que era revelado o valor numérico em percentagem, o professor C. citava o ditado de sua eleição:

"O primeiro milho é dos pardais!'

Nestes momentos épicos, a juntar às más condições do espaço, juntava-se a total incompreensão do décimo quarto e dos outros 13. Só o Sr. professor tinha conhecimento dos porquês daquela tirada sem igual.

Isto fez com que o professor C. sem se dar conta, ou dando e fosse esse o propósito, suscitasse nos alunos uma curiosidade para descobrirem o significado desta curiosa expressão e do seu obscuro significado.

Cada um dos 14 deve ter chegado à sua própria conclusão.

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Por mim aquilo que, resumidamente conclui, e que pouco tem a ver com o ditado preferido do professor, (senão no facto de o teto de notas do Sr. Professor ser, também em sincronia com o número de alunos da turma, 14), é que:

Primeiro: É errado colocar alunos e professores a trabalharem e estudarem em salas sem condições (esqueci de referir que a dita sala sarcófago era gélida no inverno, pelas portas de metal dos cacifos e nas janelas escorria água, e o Sr. Professor, mesmo quando não estava a fumar, qual dragão, exalava vapor de água, em forma de névoa digna de um romance dos cavaleiros de Avalon, a cada palavra...) 

Segundo: Duas coisas boas, já não se pode fumar em espaços fechados, muito menos em sala de aula, e já não se sentam os alunos por ordem alfabética, espero eu, nas aulas.

Terceiro: as condições do espaço físico onde se trabalha, estuda ou vive, têm influência determinante na qualidade de vida das Pessoas, neste caso de alunos e professores, e obviamente, nos resultados escolares de alunos e desempenho dos professores.

Quarto: que isto tenha acontecido no século passado, e desde então já se passaram quatro décadas, mas não se passaram alterações significativas na maioria das escolas deste país, nem na precariedade da profissão de professor, é que é assunto para refletir;

Quinto: quatro décadas depois o nível de escolaridade obrigatório aumentou para o 12° ano, e as turmas não têm, por norma, 14 alunos, mas o dobro ou mais, e isso também é um assunto para refletir.

Além destes problemas, crónicos, no nosso Sistema de Educação, existem muitos outros que atingem professores, alunos e pais de formas diferentes mas com as mesmas consequências: más condições de trabalho e estudo, precariedade nas condições de trabalho, de acesso, e em consequência as vidas de todas as Pessoas que estão neste sistema, precisam de ser melhoradas, respeitadas e dignificadas.

Por isso, sim, eu apoio a greve, e também as manifestações, as demonstrações, neste caso, quando não há nada a elogiar, nem com o que concordar.

23
Mar23

Elogio...


Cotovia@mafalda.carmona

Ou o "Teatro do Mundo" de António Gedeão

  • Este é poema vosso, Pessoas, nosso, e "meu" também depois de me ter sido oferecido por um Amigo virtual, um blogger aqui do Sapo, sobre este que é "O" Mundo, meu, nosso e vosso, em pluralidade. Essa pluralidade humana, percebo agora, onde o cumprimento ou elogio surge como mal educado se em vida.

Um mundo onde terei de, pacientemente, num exercício de desapego, esperar que o seu autor deixe esta esfera mundana, para poder ter o direito ao entusiasmo do elogio, então fúnebre, pois parece ser o único de bom tom e aceitável, para a modesta condição de algumas pessoas, a pretensão de outras ao anonimato, e, ainda aquelas que o sentem como uma agressão, como se quem elogia, cumprimenta, ou agradece, o fizesse com a intenção de legitimar a egocêntrica intelectualidade, superioridade ou cultura, num esfregar de umbigo narcisista.

Provavelmente, digo eu, quem elogia, tem como sentimento, não o se sentirem superiores, ou terem a pretensão de dar o seu aval seja ao que for, mas pelo motivo de genuinamente gostarem, e de ser um contributo inesperado para a vida, pois nesse momento de partilha, surge a ilusão, ou sonho, de se pertencer a um todo muito maior do que a individualidade.

Na impossibilidade de terem capacidade para retribuir, em igual medida, neste dar, manifestam o cumprimento ou o elogio em reconhecimento desse receber, amizade, amor, gratidão.

Não é grandiosidade.

É humanidade, não é para satisfazer os outros, é para os reconhecer.

E neste processo é, fundamental, também por respeito e lealdade, citar os autores, nomear, dando os créditos a quem de direito, numa demonstração de reconhecimento, de memória (que mesmo não servindo para muitas outras coisas, terá de servir para esta) para citar, quem antes o disse e escreveu, viveu e partilhou, se disso tivermos conhecimento (ainda que o desconhecimento não desobrigue).

Talvez por a minha escolaridade ser técnica, em eletrotecnia, que me é instintivo enunciar as leis, e os seus autores, e tal como a Lei da Relatividade de Einstein E=mc², ou a Lei de Lavoisier que todos nos habituamos a enunciar como "Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma", também as experiências vividas terão uma finalidade.

E, até mesmo o tempo que julgamos ter perdido, num emprego, numa relação, num compromisso, ou a lutar por uma causa, quando os resultados não se anteveem, como o caso das greves neste momento, (dos oficiais de justiça, e as que tem acontecido, dos professores, dos médicos, enfermeitos, trabalhadores da CP, comunicação social...)

Assim, deveremos parar as demonstrações?

E podemos fazer um exercício e imaginar uma sociedade sem estas demonstrações, sejam de greve, de agrado, de desagrado, de apoio, de solidariedade, de ajuda, de felicidade, de tristeza, de entusiasmo, de pesar, e refletir como seria e quais seriam válidas e aceitáveis, e quais teriam de ser medidas, contabilizadas, e mesmo abolidas, e refletir sobre as consequências e mundo resultante.

Entretanto, conquistámos a democracia, foi uma luta de gerações para se mudar, foi preciso uma revolução, e alcançamos juntos a democracia, mudamos políticas,  costumes e mentalidades, fizemos, muito recentemente, na pandemia covid, enormes sacrifícios, dura realidade de muitos, consciência de todas as perdas.

Acabou o inaceitável "um homem não chora".

Passamos agora para o aceitável "um homem não ri".

Pode ser alegado que no tom, na medida dessa demonstração, tem de ter um limite, aceito que por educação e em nome do convívio, ou do que é "adequado" em sociedade, há necessidade de refrear essas demonstrações, para encontrar um equilíbrio, que, respeite as diferenças para não se tornar agressivo, ou mesmo asfixiante.

Ou seja o abraço físico voltou a ser possível, mas o abraço emocional, é uma companhia inconveniente. 

E, porque não é possível ter dois pesos e duas medidas se nos propomos aceitar, e por em prática, a pluralidade em igualdade, é importante a aprendizagem de saber dar este abraço emocional, saber elogiar, e, igualmente importante, saber receber o elogio.

Coisa que, ao invés da agressão, não se aprende nas escolas, muitas vezes nem no núcleo familiar e, infelizmente, estamos mais habituados a reagir a uma ofensa ou agressão do que a um elogio, embora tanto na ofensa como no elogio, esteja implicado um julgamento do Outro, e a pessoa que o recebe, pode sentir-se constrangida ou mesmo envergonhada, agredida, ou ainda, terrível, na obrigação de retribuir.

Na retribuição da ofensa todos fomos educados a saber o que dizer, fazer, reagir.

Já quando nos dirigem um elogio, de consideração, interesse, respeito, admiração, estima e afeição, ou até mesmo a enaltecer a gentileza, amabilidade, simpatia, inteligência ou capacidade, ficamos desconfortáveis, quase preferíamos a ofensa. E em vez de ser uma alegria e motivação, é uma preocupação e gera ansiedade, mais do que levar uma bofetada.

Pode parecer estranho como um elogio, sentido e verdadeiro, é tão prejudicial.

Talvez por isso os amorfos polegares azuis sejam, afinal tão mais reconfortantes, e mantenham a sua confortável superioridade, beneficiando da inércia da vontade na aprendizagem da prática saudável do elogio e do cumprimento.

De sermos amigos uns dos outros... em vida.

Assim, a propósito, mas sem propósito senão o da manifestação da diversidade de sentires, seres e estares, aqui ficam transcritas as palavras de António Gedeão, nos poemas, "Teatro do Mundo" e "Movimento Perpétuo", logo a seguir à fotografia, originalmente publicada pelo jornal Sol, aqui no Sapo, no artigo https://sol.sapo.pt/artigo/549818/romulo-de-carvalho-antonio-gedeao-um-principe-renascentista-atravessa-o-seculo-xx, 

Boa tarde, Pessoas!

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Teatro do Mundo

Venho da terra assombrada,

do ventre de minha mãe;

não pretendo roubar nada

nem fazer mal a ninguém.

 

Só quero o que me é devido

por me trazerem aqui,

que eu nem sequer fui ouvido

no acto de que nasci.

 

Trago boca para comer

e olhos para desejar.

Com licença, quero passar,

tenho pressa de viver.

Com licença! Com licença!

Que a vida é água a correr.

Venho do fundo do tempo;

não tenho tempo a perder.

 

Minha barca aparelhada

solta o pano rumo ao norte;

meu desejo é passaporte

para a fronteira fechada.

Não há ventos que não prestem

nem marés que não convenham,

nem forças que me molestem,

correntes que me detenham.

 

Quero eu e a Natureza,

que a Natureza sou eu,

e as forças da Natureza

nunca ninguém as venceu.

 

Com licença! Com licença!

Que a barca se fez ao mar.

Não há poder que me vença.

Mesmo morto hei-de passar.

Com licença! Com licença!

Com rumo à estrela polar.

 

António Gedeão, Teatro do mundo

 

Impressão Digital

 

Os meus olhos são uns olhos,

e é com esses olhos uns

que eu vejo no mundo escolhos,

onde outros, com outros olhos,

não vêem escolhos nenhuns.

 

Quem diz escolhos, diz flores!

De tudo o mesmo se diz!

Onde uns vêem luto e dores,

uns outros descobrem cores

do mais formoso matiz.

 

Pelas ruas e estradas

onde passa tanta gente,

uns vêem pedras pisadas,

mas outros gnomos e fadas

num halo resplandecente!!

 

Inútil seguir vizinhos,

querer ser depois ou ser antes.

Cada um é seus caminhos!

Onde Sancho vê moinhos,

D.Quixote vê gigantes.

 

Vê moinhos? São moinhos!

Vê gigantes? São gigantes!

 

in "Movimento Perpétuo", 1956

 

 

22
Mar23

Leila...


Cotovia@mafalda.carmona

...ou livros para o mês de Março...

  • ou finalmente, quais são os 5 amigos de asas residentes aqui no ninho da Cotovia nesta quinzena? ...ou, como me apaixonei por Elif Shafak!

Sem desmérito nem para com os restantes livros, nem para com os seus autores, o reencontro com a escrita de Elif Shafak, neste " 10 Minutos e 38 Segundos Neste Mundo Estranho" depois do livro " A Cidade nos Confins do Céu" onde me tinha encantado como construtora de mundos, apresenta-se aqui como uma arquiteta de sentidos!

E é um amor à primeira vista, esta leitura agressiva mas real, em capítulos dedicados, cada um deles, exatamente, a um dos 10 minutos e 38 segundos, posteriores à morte da personagem Leila, na primeira parte do livro "A Mente", para na segunda parte, "O Corpo", abordar vários temas entre eles o luto e o karma.

Mas antes, para garantir algum equilíbrio nesta tertúlia, vou apresentar os 5 convidados:

1. 10 Minutos e 38 Segundos Neste Mundo, Elif Shafak;

2. Milagrário Pessoal, Eduardo Agualusa;

3. Contos de Grimm, Philip Pullman;

4. Quando Nada Acontece, Kathryn Nicolai;

5. Destemidas 2, Pénélope Bagieu.

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Os 5 livros requisitados por empréstimo na Biblioteca Municipal de Sesimbra 

Assim a primeira convidada a ser apresentada neste encontro será Elif Shafak com o já referido livro, do ano de 2019, traduzido para esta edição da Presença em 2020, com 320 páginas mais uma dedicada ao leitor com alguns esclarecimentos, de onde destaco a primeira frase:

"Muitas coisas neste livro são reais, e tudo é ficção."

Continua:

"O cemitério dos Sem Companheiros em Kilyos é um lugar real. Está a crescer rapidamente. Nos últimos tempos, um número crescente de refugiados, que se afogaram no mar Egeu quando tentavam atravessar para a Europa, foi ali enterrado. Como todos os outros túmulos, os deles têm apenas números, raramente nomes."

E, quem é Shafak? 

Shafak nasce em Estrasburgo, na França, mas cresceu na Turquia, país onde é a autora mais lida, e escreve em inglês e turco. Estudou relações internacionais na Universidade Técnica do Oriente Médio em Ancara, na Turquia, antes de fazer o doutoramento em ciências políticas na Universidade de Middlesex, em Londres. Shafak também trabalhou como jornalista, e em 2017 foi escolhida pela organização de jornalismo Político, como uma das 12 Pessoas que tornam o mundo melhor e é detentora do título "Chevalier deles Arts et des Letters". 

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E o que posso dizer da escrita de Shafak, ou quais as razões pelas quais me apaixona ler os seus livros?

O que me atrai em Elif Shafak é a sua originalidade e habilidade na abordagem temas complexos de um modo inovador, pelo que o termo "Avant-garde" surge na minha cabeça, como uma possibilidade quando leio as suas histórias, por ser mesmo "muito à frente", e pergunto-me quais serão os efeitos da sua escrita na sociedade turca, onde é a autora mais lida.

Suponho que embora fosse possível seguir esta linha de argumento, e defender que se podem encontrar elementos desse estilo na sua escrita, como o uso das técnicas experimentais e a exploração de temas complexos e controversos, também, mas não só, da desigualdade de género, não creio que possa incluí-la no movimento avant-garde no sentido estrito do termo (até porque desenquadrado historicamente).

No entanto, uma coisa posso, é descreve-la como uma escritora contemporânea inovadora, altamente experimental, que frequentemente alterna entre diferentes personagens e perspetivas, quase como se as personagens fossem simultaneamente narradoras.

E, como reflexo da sua própria vivência, incorpora referências literárias, culturais e históricas nas histórias, o que traz para a leitura uma descoberta intertextual permanente, que vai para além das fronteiras culturais e geográficas, e cujos temas universais são de importância global.

Se tivesse de apontar pontos a ter em atenção na escrita de Shafak, como alerta à navegação, e sem que isso seja necessariamente negativo, diria que, por vezes, a escrita de Shafak pode ser um pouco confusa e difícil de seguir, especialmente quando incorpora muitos elementos diferentes nas histórias, o que no entanto, voltará a remeter esta análise para o aspeto avant-garde.

Resumindo as convicções da autora de acordo com as suas declarações:

"Acredito que todas as pessoas têm histórias para contar, independentemente de quem sejam ou de onde venham. E todas as histórias são igualmente importantes e válidas." Acredito que a identidade é uma coisa fluida e mutável. Todos nós temos múltiplas identidades que mudam ao longo do tempo e em diferentes contextos." pois "a literatura é uma das poucas coisas que nos podem conectar verdadeiramente uns aos outros. Quando lemos, somos capazes de ver o mundo através dos olhos de outra pessoa e entender a sua perspetiva." e que "a empatia é fundamental para a construção de uma sociedade justa e equitativa onde precisamos colocar-nos no lugar do Outro para tentarmos entender a sua perspetiva, para construir uma sociedade mais unida e pacífica."

Atualmente, Elif Shafak vive em Londres com a família, é casada e tem duas filhas. Nas suas obras, frequentemente explora os temas relacionados com a família, identidade e cultura, e muitas vezes incorpora elementos autobiográficos na sua escrita, muitos dos quais são encontrados em "10 Minutos e 38 Segundos neste Mundo Estranho" pois a autora, assim como a personagem principal do livro, crescem em Istambul e têm uma forte conexão com a história e cultura desta cidade. Noutros exemplos, que ainda não li, como no livro "A Bastarda de Istambul", explora sua própria experiência como turca de origem arménia, e nas "Três Filhas de Eva", aborda as diferentes facetas da sua identidade como mulher, mãe e escritora, e será uma leitura a agendar para breve.

 

Além disso, nas suas entrevistas e artigos, Shafak frequentemente reflete sobre sua própria experiência como escritora, e aborda temas como a importância da literatura na sua vida, como é a sua abordagem à escrita, e como as experiências de vida influenciam e determinam o seu trabalho.

 

Deixo aqui alguns links interessantes que podem complementar esta publicação e fornecer mais informações sobre a autora e a sua obra:

Site oficial da Elif Shafak: https://www.elifshafak.com/

Entrevista com Elif Shafak no programa de televisão britânico "The Late Show with Stephen Colbert": https://www.youtube.com/watch?v=ywmiV8pRZuE

TED Talk da Elif Shafak intitulada "O poder dos contadores de histórias transcendentais": https://www.ted.com/talks/elif_shafak_the_politics_of_fiction/transcript?language=pt-br

Artigo para o The Guardian: https://www.theguardian.com/books/2017/jun/10/elif-shafak-writing-stories-can-help-heal-wounds

Entrevista com Elif Shafak para a revista New Yorker: https://www.newyorker.com/books/qa/elif-shafak-on-writing-and-dissent-in-turkey

Palestra para o TED: https://www.ted.com/talks/elif_shafak_the_politics_of_fiction/transcript

 

Como nota pessoal, (como toda esta análise, e como alerto sempre, estas coisas são, apenas, deduções minhas, subjetivas) não posso senão concordar com Elif Shafik, pois também acredito que a literatura é uma forma importante de ligação entre as pessoas, que permite que vejamos o mundo através dos olhos do Outro, e possamos entender as suas perspetivas, bem como nos aproxima uns dos outros, tornando-nos mais empáticos, e mais importante, constrói caminhos para uma sociedade justa e equitativa.

Na próxima publicação, irei apresentar-vos o segundo livro desta lista, "Milagrário Pessoal", de Eduardo Agualusa.

Boas leituras, Pessoas amigas, com os 5 sentidos, neste primeiro livro de 5 amigos!

P.S.

Deixo aqui também parte da primeira página deste meu livro convidado de hoje:

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20
Mar23

5 Primaveras...


Cotovia@mafalda.carmona

Ou quinto aniversário do blog Cotovia e Companhia (Viva!)
 
  • Ou porque é dia de manifestações dos professores...ou porque hoje é o último dia de inverno antes da primavera...
    ...ou porque primavera rima com Milan Kundera, da "Insustentavel Leveza do Ser", na cidade de Praga, em 68, do século passado, que é também o ano do meu nascimento, e foi na primavera de 2018, deste século XXI, a data de estreia deste blog da Cotovia e Companhia...
     

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Quotidiano banal, fotografia de Mafalda Carmona

 
Viva! A Cotovia e Companhia completa hoje 5 primaveras!
 
Justamente no mesmo dia em que os professores se manifestam, em marcha lenta, pelos seus direitos, em 5 cidades portuguesas.
 
Finalmente, coisa mais corriqueira e de somenos importância, mas de grande alegria para esta Cotovia, a laranjeira no quintal voltou a dar flor, depois de ter sido transplantada há 2 anos, e isso é uma grande felicidade porque me lembra a casa da avó O., de Olympia, como a cidade grega, que favorecia a endurance e os audazes, perpetuada nos jogos Olímpicos, e a reforçar este ambiente de passar o testemunho, da revolução, renovação e reinícios.
 
Por todas estas razões, e porque a associação de umas ideias leva a outras ideias, irei falar sobre 5 livros...ou 5 livros para uma vida!
 
E não, ainda não é hoje que vos apresentarei os 5 livros que trouxe da Biblioteca Municipal de Sesimbra, pois estão a recuperar do encontro com o Sr. Shopenhauer.
 
Se vou falar de livros, também vou falar de paixão, não d"A" paixão de Cristo, que isso é mais apropriado na sexta-feira de Páscoa, mas da paixão pela leitura e pelos livros, pois esta paixão faz a diferença no meu quotidiano e mesmo no rumo da minha vida.
 
Porque há mesmo "O" livro que faz toda a diferença, tal como "A" música que faz toda a diferença, e como pude já sentir nesta plataforma de blogs, também há "A" publicação que muda, ou reforça, ou põe em dúvida, a nossa perspectiva de vida, opinião ou sentir.
 
Quanto a música, não será neste post que a irei considerar, se bem que também as tenha, "As" "Minhas" "Músicas", tudo com letras maiúsculas, e não sendo minhas, sou completamente grupie fãzoca quanto a elas, pois acredito piamente que foram escritas e musicadas só para mim, desculpem as restantes Pessoas, não tenho qualquer noção de razoabilidade neste tema...
 
Vamos então ao que me trouxe aqui Hoje:
 
A paixão... dos livros e, mais concretamente, concretizada (viva a redundância) quer no livro como nas Pessoas autoras por trás do livro.
 
Assim, por ordem de chegada, os livros da minha vida, e porquê:
 
0 (livro bónus, mais ou menos o livro de boas vindas).O livro d' "O Patinho Feio", percebi cedo que por vezes a cegonha tem o GPS avariado, mas que tudo tem um significado;
 
1."O Meu Pé de Laranja Lima", passei a gostar de ser criança, não vale a pena odiar a limitação, há sempre um lado bom em qualquer situação;
 
2. "Um Homem Estranho, Numa Terra Estranha", utopias e distopias mostram a importância de sermos todos por um, e um por todos, disso depende a sobrevivência e sanidade da humanidade;
 
3. "Anne Frank, diário", a conivência é mãe de todas as guerras, não olhar para o lado, não ser indiferente quando as injustiças estão a acontecer, ao nosso lado, e a obrigação de escolher um lado, é o garante para manter a humanidade da humanidade;
 
4. "As Vinhas da Ira", a capacidade de suplantar as dificuldades, a diferença de ser a reação ou a ação, e tomar consciência de como essa escolha é determinante para alcançar a independência;
 
5. "A Insustentável Leveza do Ser", a liberdade existe e é uma possibilidade, sempre, mesmo sendo o elemento mais leve, que voa, e se dilui no tempo, mistura-se com toda a gente, precipita-se com a ditadura e a sua única prisão é a verdade, vigiada pelo respeito;
 
E vós, Pessoas, qual foi Aquele livro que fez toda a diferença nas vossas vidas?
 
"O" livro?
E "A" publicação?
"A" música?
 
Ou, colocando-vos a seguinte pergunta:
 
"-Se pudessem voltar atrás nas vossas vidas, Pessoas, e ter o poder de recomendar a vós mesmas uma leitura, e apenas uma, qual seria? E porquê?"
 
Uma leitura, uma música, (re)definem uma vida...(?)
 
Boa Primavera, semana e dia feliz, e se for o caso de manifestação, força Pessoas!
 

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{Cotovia} em Colectânea

Sinopse A Coletânea “ERA UMA VEZ…ALENTEJO” é uma obra que inclui poemas, fotografias, ou obras artísticas originais cujo tema e foco principal seja o Alentejo, e está abrangida no projeto europeu “Antologias Digitais”. Tendo a cidade de Évora sido recentemente nomeada Capital Europeia da Cultura 2027, faz todo o sentido homenagear não só a cidade como também toda a beleza circundante e riqueza cultural da região, e observar as maneiras como estas inspiram as pessoas de vários pontos do globo. Autor: Vários Formato: pdf Edição: 08.05.2023 Ilustração capa e contracapa: Ana Rosado; Vítor Pisco Editora Recanto das LetrasBaixar e-book

{Cotovia} em Antologia

Sinopse Aquilo que temos vindo a testemunhar desde 20 de fevereiro de 2022, provoca em nós sentimentos complexos, melhor expressados através da arte. Esta antologia recolhe estes sentimentos, e distribui-os para quem neles se reconforta e revê. Para o povo ucraniano, fica a mensagem de acolhimento, não só em tempos de crise, mas sempre. Porque é difícil expressar a empatia por palavras, mas aqui fica uma tentativa, por 32 autores, nacionais e internacionais. Autor: Instituto Cultural de Évora Formato: pdf Edição: 14.08.2023 Ilustração capa e contracapa: Ana Rosado Editora Recanto das Letras

{Apoio à Vítima}

A APAV tem como missão apoiar as vítimas de crime, suas famílias e amigos, prestando-lhes serviços de qualidade, gratuitos e confidenciais. É uma organização sem fins lucrativos e de voluntariado, que apoia, de forma qualificada e humanizada, vítimas de crimes através da sua Rede Nacional de Gabinetes de Apoio à Vítima e da sua Linha de Apoio à Vítima – 116 006 (dias úteis: 09h – 21h). Aquando de um crime, muitas pessoas, para além da vítima directa, serão afectadas directa ou indirectamente pelo crime, tais como familiares, amigos, colegas. A APAV existe para apoiar. Os serviços da APAV são GRATUITOS e CONFIDENCIAIS.

{Notícias Sobre a Ucrânia}

A UE condena com a maior veemência a agressão militar não provocada e injustificada da Rússia contra a Ucrânia. Trata-se de uma violação flagrante do direito internacional, incluindo a Carta das Nações Unidas. Apelamos à Rússia para que cesse imediata e incondicionalmente todas as hostilidades, retire o seu pessoal militar e equipamento de todo o território da Ucrânia, no pleno respeito pela soberania, independência e integridade territorial da Ucrânia dentro das suas fronteiras internacionalmente reconhecidas. A UE apoia os princípios e objetivos fundamentais da fórmula de paz da Ucrânia enquanto via legítima e credível rumo a uma paz global, justa e duradoura.
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