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Saudade, ausência e preguiça.
Palavras pesadas que, quando juntas, adquirem contornos de negligência. No entanto, são apenas consequência: a ausência de preguiça equivale ao entusiasmo pela vida que acontece, com espaço e lugar para o espanto de outra vida a nascer, a crescer, a aprender a interagir com este mundo, para além do mundano.
E surge a saudade de nos mantermos longe das notícias, do colapso da história, trucidada por moto-serras, auxiliadas e promovidas pelos agentes da comunicação, ou informação que cultiva a desinformação, da subsequente e irresponsável valorização da mediocridade, entregues a uma pandêga desvairada, na perspectiva de poder e riqueza, depois de lhes ter sido confiado, pelo povo – esse coletivo impalpável e estranho, ora forte, ora fraco, racional e irracional ao mesmo tempo – o destino das nações.
Será o futuro um lugar onde a Liberdade estará remetida para as paredes inertes de um museu?
Que tempo e que mundo aguardam aqueles que crescem agora, as crianças deste mundo?
Que será da poesia, da escrita, da comunicação?
O que nos trazem os dias de hoje e o que preparam para o futuro? O que acautelam? O que permitem?
Será a poesia refúgio ou agente de transformação? Reflexo ou catalisador?
A poesia é pátria imortal, onde a palavra renasce em esperança enquanto a vida observa.
{Poetry is an immortal homeland, where words are reborn in hope as life looks on.}
Saudade de ti
{Poema}
Desejaria apenas, Poesia,
Um desejo dito não nomeado,
Chuva fértil que, no entanto, não molha.
Calor ausente de corpo e matéria,
Sentimento que, enquanto se esvai, nasce.
Sublime nudez, deveras vestida,
Tapando-se e destapando-se, brinca,
Até se ver perdida em novidade
Neste mundo ao revés e conturbado.
A tua candura passou de moda.
Vai agora envergonhada, alheia,
Retornada e tornada mais que céptica,
Cínica, irónica e agreste. Triste.
Saraivada de areia tão fina,
Sal em recente e discreta ferida.
Dir-se-ia, assim, ser óbvio e evidente:
Só existes em etérea esfera.
Assim fosse eu figura transmutada
Em palavra única e singular,
Serias tu a minha vigil morada,
Mesmo se te vês negligenciada.
Bem saberás que a ti retornarei,
Com saudade de tudo o que em ti vivi.
És a Patriamar universal,
Na terra onde um dia sossegarei,
A desejar, apenas, poesia,
Na cadência de um verso final,
E a minha alma repousa em alegria,
Onde a palavra renasce imortal.
@mafalda.carmona
21.02.2025