Olá Alegria e Bom Carnaval!
Cotovia@mafalda.carmona
Ou como a "galinha da vizinha parece (mas não é) melhor do que a minha"
- A propósito da alegria associada a esta época carnavalesca, que em Sesimbra é festejada em grande, com participação de todos os de cá e dos que quiserem vir foliar, desde a semana passada com os trapalhões, a noite de sexta feira e sabado, domingo pela tarde, até ao desfile dos palhaços na segunda e o grande desfile na avenida na terça, republico um monólogo da Cotovia.
Bom Carnaval para todos, e haja alegria!
Andava eu na minha vida, por aí esvoaçando (gerúndio muito pouco querido a Stephen King, mas o autor não deve conhecer nem o Alentejo nem o Algarve, senão percebia a sua abrangência e complexidade existencial como um destapa olhos para o Senhor Mestre do género da escrita de terror), quando ouvi o seguinte comment, ao vivo e a cores, em direto, proferido por alguém, anónimo para o caso, em relação a um grupo de pessoas que se manifestavam de modo alegre e expansivo...
"- Parecem umas galinhas".
Não foi a primeira oportunidade de registar a ocorrência deste comentário.
É recorrente. Em sentido pejorativo.
Por anónimos, só que não. E por um personagem saído de um dos 60 romances e 200 contos de Stephen King, tal o horror, só que não.
Obviamente existem "Aqueles" locais propícios à seriedade, à reflexão, à tristeza, locais para estarmos sossegados e não perturbarmos o silêncio necessário às atividades aí desenvolvidas, das bibliotecas, aos locais de trabalho passando pelas morgues, velórios, consultórios, hospitais e outros mais. Normalmente, alguns onde exista ou persista dúvida (dúvida essa geralmente agudizada pelo desassossego da espera prolongada para além do ponto da cãibra), como os cartórios e lojas do cidadão, até têm uma sinalética a indicar essa regra, não vá algum de nós estar mais irrequieto e sem capacidade de concentração ou distraído.
Era este o caso, e estivesse o grupo alegre num desses locais, e a regra poderia aplicar-se, só que não.
E mesmo se fosse inapropriado, existem modos cordiais e civilizados de uma pessoa se dirigir a outras pessoas para indicar seja o que for. A violência verbal é ilegítima, como qualquer outra violência, só que não. Por isso, a violência persiste e existe em maior grau quanto menor o grau do exercício da cidadania.
Pergunto eu, a alegria é ato vergonhoso e criminoso?
E o que justifica as pessoas serem logo ali "zurzidas" em impropérios e desdém, em agressão verbal, só por falta de lembrança do agressor ter trazido a vara de marmeleiro, ou uma marreta, para lhes acertar uma valente cacetada e passar para a agressão física?
E como, pergunto eu também, que neste momento sou a única a fazer perguntas (mas vocês Pessoas podem também perguntar e responder, "mi casa es tu casa"), é possível alguém se sentir ofendido e reagir com agressividade perante uma demonstração pública de alegria ou vivacidade?
E, ultima questão, não há final para a ditadura da seriedade compulsiva, pior do que o serviço militar obrigatório (só que não), e ser decretada a reforma permanente do "muito riso, pouco siso"?
Mas não são apenas as galinhas as visadas, ele há comparações pejorativas com outros animais, e até inanimados.
Do "teimoso como uma mula" ao "surdo que nem uma porta", há uma panóplia ofensiva sem fim, que para além de ser, no seu geral e em particular, muito pouco científica ou comprovada, ainda por cima revela, além da óbvia falta de educação, um primitivismo para lá da Idade da Pedra.
fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/
Estamos, mesmo para os mais céticos, fora da Idade da Pedra, e, é mais fácil perceber a probabilidade real de termos saímos do Paleolítico, do que a de nos sair uma casa, ou títulos do tesouro, por mais participações ou e-faturas que registemos.
Estamos, aparentemente, no Antropocénico, (ou no período Antropoceno ou ainda historicamente no contemporâneo- embora contemporaneidade desde 1789 me pareça super longuinquo, mas os estudiosos é que sabem- ou e- informático ou tecnológico ou espacial o que seja) e apesar do que lhe chamemos (e da controvérsia neste assunto), o que o resume é estarmos na parte em que passou a existir uma única espécie que determina a vida na terra, a humana. Ou seja, a Natureza "natural" manda muito pouco e a "natureza" humana manda quase tudo e demasiado.
"Humans go from being participants in the whole earth to being a dominant feature, dominating the oceans, the lanscape, agriculture, animals. (...)"
Por isso não há desculpas, nem podemos culpar os dinossauros, deixemos lá os apedrejamentos para a parte sanguinária da história da civilização, digna dos compêndios de história e do antigo testamento, e também incompreensível prática ainda nos dias de hoje, onde e quando não existe constituição, república, democracia ou direitos.
Parte em que não estamos, graças à dupla da Revolução dos Cravos do 25 abril de 1974 e do 25 de Novembro de 1975.
E, não foi ontem, já tivemos bastante tempo para praticar, e, era suposto termos adquirido alguma capacitação.
Desde aí, estamos e vivemos num regime de Liberdade, temos direitos (e obrigações, nomeadamente o dever de fazer prevalecer essa mesma liberdade), igualdade, de género, religião e expressão, fraternidade, em democracia, estamos mesmo naquela parte onde podemos escolher ser quem quisermos.
E se podemos ser quem quisermos, escolhamos ser gentis, e deixemos em paz as galinhas, não sejamos cocós e tentemos contribuir para que os que nos rodeiam também não o sejam.
O fim do mundo duvido que se amedronte ou assuste com caras sisudas, as chamadas carantonhas!
Para isso já temos os "caretos", neste caso os de Lazarim que tinham alguma utilidade.
De resto...Cara alegre sempre que possível, e desde que não estejamos a viver um dos momentos referidos onde a natureza é tristeza, sejamos felizes!
Ou pelo menos tentemos não ficar ofendidos com a felicidade alheia!
"Em Lazarim celebra-se o carnaval, que é considerado o Entrudo mais tradicional de Portugal. A festa é caraterizada pelos Caretos, cortejo etnográfico, e testamentos satíricos, numa licenciosidade vinda de tempos em que tudo era vivido em clandestinidade, confrontando a autoridade institucional e religiosa vigente, os caretos usam máscaras de madeira de amieiro com fisionomias de traças zoomórficas."