Não há coincidências...
Cotovia@mafalda.carmona
Ou os caminhos misteriosos e os mistérios da intuição.
- Sei bem que a matemática, os números, as leis, são uma criação, coisa artificial e necessária. Mas, apesar disso, os pastores sabem pelo comportamento das ovelhas do seu rebanho qual o tempo que vai fazer, e com uma antecedência de 3 dias, o que não é coisa pouca! Não há matemática nem boletim meteorológico responsável por este comportamento das ovelhas, da galega bragançana à churra algarvia, nem são exemplo único de como se pode "fazer contas à vida" mesmo sem recurso a máquinas de cálculo e outras engenhocas complexas.
Ora aqui vou incluir um Pré Scriptum, se é que tal coisa existe, um P.S porque hoje andei a passear pelos lados do Cabo Espichel, e enquanto andava por ali a ouvir os sons da natureza, provavelmente o ar puro inspirou os neurónios que ainda aqui resistem, e tive a seguinte ideia, brilhante na minha, sempre, modesta opinião de pequena ave cantadora:
O suporte de leitura dos posts, publicações, textos ou monólogos como preferirem, pode abranger outros meios, nomeadamente, o áudio! Faz todo o sentido na minha cabeça poderem "ouvir" aquilo que a Cotovia e Companhia vai publicando aqui neste canto da plataforma do Sapo.
Por isso, assim que tive oportunidade pus-me a descarregar aplicações na play store mesmo ao disparate até conseguir uma versão narrada do "Não há coincidências".
Aqui fica e assim podem ficar aí sossegados com os phones ligados, nem cansar a vista e além disso para quem, como eu, vê um poucochinho mal (ou mesmo muito mal), suponho que seja um descanso!
Boas escutas!
Para quem optou por prosseguir com a leitura, aqui continua o texto, boa leitura!
Esta contabilização será feita por acumulação do registo mais ou menos intuitivo, ou empírico, de ocorrências semelhantes e respetivas consequências.
Devemos ter cá dentro, num dos hemisférios, em parte ainda por descobrir, uma qualquer sala de estatística a somar e subtrair eventos, meteorológicos entre outros, para depois nos auxiliar na tomada de decisões em situações semelhantes no seu padrão ou aparente regularidade.
Admito ser esta uma forma fantástica de aliviar o stress causado pela centena de decisões, conscientes, tomadas diariamente, segundo o artigo (aqui) o número avançado é de 122, suponho que em média, e se reduzirmos o número de horas diurnas para 15 obtemos o valor de 8 decisões por hora. Este valor depende da atividade profissional de cada um e do nível de responsabilidade, pelo que, compreensivelmente, são descritos como mais stressantes e desgastantes os trabalhos que obrigam a um maior número de decisões. Se forem incluídas também as decisões automáticas, incorporadas nos nossos gestos do dia a dia, o valor sobe para os milhares de decisões, por isso, também compreensivelmente, se tivéssemos de pensar em quantas vezes pestanejar ou respirar por minuto, acredito, não faríamos mais nada.
https://pt.m.wikipedia.org/wiki/
E isto sem irmos aos primórdios da existência e sobrevivência da espécie quando um predador estaria pronto a saltar debaixo de cada calhau, pequeno ou grande, desde escorpiões e víboras até tigres ou lobos, todos eles, perigos terminais para a esperança média da idade de vida, e por isso automatismos de fuga, defesa, ataque ou plano, entre eles fingir-se de morto, um plano muito recorrente em várias espécies, teriam de instantaneamente ser implementados.
Como nessas circunstâncias não era possível fazer uma reunião e brainstorming com os outros elementos da tribo, e a necessidade de ação era imediata, a reação teria de ser rápida e automática. O mesmo acontece quando hoje em dia numa viagem a um local desconhecido, andamos de "antenas" bem sintonizadas, com o desconfiometro na máxima potência para evitar problemas de maior, atentos aos movimentos e "sinais" de alarme, tentando em frações de segundo, consultar o nosso catálogo de alarmes, para encontrar correspondências se for o caso e tomarmos as medidas necessárias. Porque pensar naquilo como se fosse a primeira vez será certamente o prenúncio de desastre ou no mínimo de uma canseira e até burnout do viajante. É por isso que algumas viagens são tão cansativas e tanto mais quando feitas em voos a solo, sem o apoio alargado proporcionado por um grupo.
Ter estes mecanismos, no seu geral, é útil, é mesmo essencial.
Mas como todas, ou quase todas, as situações, há o reverso da medalha.
Ou seja, nem sempre estes automatismos são bons.
Isto porque deixamos de pensar naquilo que estamos a fazer e o cérebro fica privado de estímulos diferentes ou informações novas e em consequência os resultados obtidos serão inevitavelmente os mesmos. Mais ou menos como quando o sistema de renovação de ar está funcionar em circuito fechado, com o ar que já estava dentro do habitáculo. Nada sai, nada entra. Sendo útil no controle de contaminantes, é bastante inútil para chegar a qualquer resultado que não esteja, de antemão, presente. Inclusivamente, como no exemplo, arriscamos a ficar sem oxigénio e nesse caso ficar sem ideias é o menor dos problemas.
Passamos a estar dependentes apenas do que já se passa dentro da nossa cabeça, ou seja, das nossas convicções e ideias pré-estabelecidas. Nada de novo vem dali, é mesmo fechado.
Surgem neste ponto as benéficas coincidências.
O seu registo permite dar um abanão a esta espécie de catatonia do pensamento virado para dentro, e os estímulos vindos do exterior do sistema prioritário de pensamento beneficiam com esta chamada de atenção para o surgimento de ideias novas, e elaboração de conclusões diversas.
Para encontrar coincidências, se existisse um manual ou aplicação para isso, a regra major seria certamente estar com muita atenção. De seguida no capitulo de definições de funcionamento estaria fazer um caminho diferente para o trabalho, mudar os móveis de lugar em casa ou ir a uma superfície comercial diferente, pois todos sabemos a aventura que é procurar provisões num local com o qual não estamos familiarizados, ler autores novos ou assistir a programas diferentes dos habituais. Basicamente é tentar planear o dia a dia nos sítios do costume como se estivéssemos numa viagem onde estamos a descobrir novidades, culturas, modos de ver e interesses a cada esquina. Trazer um pouco do mistério dos destinos de férias para as paisagens conhecidas, muitas vezes desvalorizadas.
Adotar uma atitude "antenada" mesmo na execução de tarefas rotineiras, interagir atentamente com o meio envolvente é um desafio.
Se a início pode ser cansativo, a recompensa pode ser gratificante pela descoberta de coisas novas, pela vivência da rotina numa dinâmica estimulante e enriquecida pela felicidade encontrada nas pequenas coisas, essas pequenas alegrias que também ajudam a fortalecer as asas para voos futuros onde esta prática de re-conhecimento da realidade, contrariando os automatismos, permite aproveitar em experiências dignas de 5G, o presente da vida.
Este "produto" não é vendido por nenhuma operadora de telecomunicações.
É acessível, universal, sem tarifas reguladoras, está ao alcance de cada Pessoa, e está apenas à espera de ser exercitado e pode ser resumido por "Carpe Diem", ou seja vive o momento plenamente, ou atentamente, e desde os romanos até José Saramago tem sido uma procura constante:
"A Intuição da Ilha trata de resumir aquilo que as paredes de A Casa de Lanzarote contam, a vida quotidiana, os projetos, os livros escritos, (...) tem gente dentro, cúmplices de José Saramago, (...) o homem maduro que a cada manhã começava o dia como se fosse o primeiro, e ele precisasse de lhe atribuir sentido."
Pilar del Rio em introdução a "A intuição da Ilha, os dias de José Saramago em Lanzarote"